O principal índice de ações da B3 continua “andando de lado” em 2023, como diz o jargão do mercado, apesar das apostas recentes de que o indicador poderia bater 140 mil pontos ainda este ano. No acumulado até final de setembro, o Ibovespa apresentava uma valorização de 6,22%, ligeiramente inferior à poupança, que registrava 6,33% no mesmo período, segundo levantamento feito pelo consultor Einar Rivero.

Analistas e gestores apontam que o cenário externo vem pesando contra um maior parte de cima no principal indicador acionário da B3, seja pelo cenário de juros ainda em alta nos Estados Unidos e Europa, assim como pela guerra entre Israel e Hamas. Neste último caso, as tensões entre os países colocam o preço do petróleo como ponto de atenção, o que pode afetar a inflação ao redor do mundo.

Painel eletrônico na B3 em São Paulo REUTERS/Amanda Perobelli

“Considerando que não tenhamos uma explosão ainda maior para a guerra, a perspectiva é que a bolsa brasileira ainda ande de lado em novembro, com possibilidade de melhora em dezembro e janeiro. Mas isso depende deste conflito não escalar, já que o preço do petróleo pode afetar a inflação”.

Luan Alves, analista chefe da VG Research.

Para Pedro Wilson Domingues, sócio da Nexgen Capital, o cenário externo é que vem influenciando em maior peso o desempenho do Ibovespa no ano, uma vez que nem a baixa gradativa na taxa Selic atraiu investidores para a bolsa, o que se traduziu em um índice acionário com desempenho lateralizado.

“O cenário externo, principalmente considerando os Estados Unidos e Europa, é de uma inflação alta em 2023 e com expectativa dela ainda estar alta em 2024. Com isso, os Estados Unidos devem seguir essa política de alta de juros, o que os coloca com um juro em seu maior patamar histórico por um período relevante. E isso atrai capital, causando a fuga de investimento estrangeiro do Brasil”, apontou.

Jerome Powell, presidente do Federal Reserve (Fed), vem mostrando uma visão ainda dura quanto à persistência da inflação e a necessidade de juros mais elevados por mais tempo nos EUA. E, segundo a Nexgen Capital, com uma taxa básica elevada, somado ao fato de o investidor estar emprestando capital para uma economia forte e com o menor risco no mundo, torna impossível não investir nos Estados Unidos.

Segundo carta da Verde Asset, este movimento contínuo e consistente de alta das taxas de juros dos Estados Unidos nos últimos meses levou a uma forte pressão sobre os ativos de risco ao redor do mundo, o que acabou afetando o portfólio da gestora — uma das mais renomadas do país.

“O Brasil, embora até tenha performado melhor que alguns pares latinoamericanos, não conseguiu escapar do movimento de risco e viu as ações domésticas locais, muito dependentes de um cenário global mais calmo, sofrerem”.

VERDE ASSET, EM CARTA A COTISTAS.

Já sobre os juros brasileiros, apesar destes ainda estarem em patamares elevados, as duas recentes reduções na taxa Selic pelo Comitê de Política Monetária (Copom) para os atuais 12,75%, assim como sinais de mais baixas por vir,  acabam por tornar o Brasil “menos atrativo” ao investidor estrangeiro, uma vez que o risco de se emprestar para o país latino americano é bem maior que para o governo americano.

Segundo o analista chefe da VG, as medidas que o Banco Central vem tomando para reduzir a pressão monetária ainda não impactaram totalmente a bolsa brasileira. “Talvez venhamos a sentir esse  impacto no primeiro semestre de 2024”, observa.

Pesos pesados que distorcem o Ibovespa

Analistas apontam que as empresas que têm maior peso no índice das blue chips brasileiras acabam por distorcer o desempenho do Ibovespa, ou ainda, de colaborar com que as apostas de 130 até 140 mil pontos até o final de 2023 se concretizem — ou não. Um exemplo é a Vale (VALE3), que representa 14,57% do indicador, segundo dados da B3.

No ano, a mineradora acumula queda de 25%, o que impacta diretamente no desempenho do índice. E esse resultado se deve em maior parte à economia chinesa, já que a companhia brasileira exporta uma grande quantidade de minério de ferro para o país asiático, e os preços do mercado global são influenciados pela demanda chinesa.

“Decisões estratégicas da Vale também são moldadas pela situação econômica chinesa, portanto flutuações na economia da China podem impactar diretamente os resultados financeiros da empresa”.

Bruna Sene, analista da Nova Futura Investimentos.

Ainda assim, a analista aponta que se for analisado o último trimestre, as ações da Vale conseguiram tomar fôlego dados os anúncios de estímulos por parte do governo chinês na economia do país, além de o minério de ferro ter permanecido em um patamar elevado de preços, “o que contribui positivamente para as margens da companhia”, disse.

Luan Alves, da VG, faz coro com Sene e reitera: “a Vale tirou a possibilidade de o Ibovespa bater os 130 mil”. Ainda assim, a ação da mineradora foi a mais indicada por 19 casas de análises em outubro.

Por outro lado, a Petrobrás (PETR4) vem se destacando como uma das maiores altas do Ibovespa em 2023, já que acumula mais de 58% de alta no ano, e de quase 80% considerando os valores ajustados por proventos pagos. E segundo a analista da Nova Futura, a condução da nova gestão da companhia surpreendeu positivamente o mercado, com anúncios de política de preços e dividendos vindo melhores do que o esperado.

“É uma companhia que continua com valuation atrativo, e estes eventos vindo melhores do que o esperado, animaram os investidores. Petrobras se mostrou um ativo mais estável e em tendência de alta forte”, disse.

Bruna Sene, analista da Nova Futura Investimentos.

A petroleira representa 7,8% do Ibovespa, o que é menos da metade do peso da Vale na carteira do índice.

Petrobras, Rio de Janeiro

‘Achados’ do Ibovespa

A analista da Nova Futura reitera a necessidade de um olhar apurado para boas oportunidades dentro da carteira do Ibovespa, o que tende a acelerar os ganhos para além do índice.

“Apesar de os investidores visualizarem um desempenho do Ibovespa no acumulado do ano ainda abaixo, em especial quando comparado a produtos de renda fixa, saber fazer boas escolhas de ações dentro do índice assim como ter uma estratégia bem definida para isso, pode resultar em bons frutos”.

Bruna Sene, analista da Nova Futura Investimentos.

No geral, analistas reiteram a visão positiva para a bolsa brasileira, assim como gestoras, a exemplo da RPS Capital e Ibiuna Investimentos.

Em sua carta mensal referente outubro, a Ibiúna apontou que algumas empresas brasileiras estão sendo negociadas em preços que mais que compensam o atual cenário. Dentre as ações deste grupo, foram aumentadas as posições em Eletrobras (ELET3), Casado (AURE3) e Localiza (RENT3), mantendo inalteradas as  posições em BB Seguridade (BBSE3), Copel (CPLE3), M. Dias (MDIA3) e shopping centers, como, Aliansce Sona (TAMBÉM3) e Iguatemi (IGTI11). Porém, Vale (VALE3) e Prio (PRIO3) tiveram reduções na alocação a fim de manter equilíbrio na carteira da gestora.

Por sua vez, a RPS Capital apontou estar confiante com o setor de construção civil focado em baixa renda, a exemplo de Direcional (DIRR3)MRV (MRVE3) e Tenda (TEND3), já que o entendimento da gestora é de que este é um “ótimo momento operacional, o que deve melhorar ainda mais com as revisões recentes do programa Minha Casa Minha Vida”.

A Sabesp (SBSP3) também é bem vista dado o valuation próximo das mínimas históricas e possibilidade de privatização nos próximos 18 meses, e a Oncoclínicas (ONCO3) por estar em um subsegmento do setor de saúde que mais se beneficia pela dinâmica de envelhecimento da população.

A gestora também aposta em bancos de investimentos e digitais, como, BTG Pactual (BPAC11), XP (XPBR31) e Banco de Pão (BPAN4), já que o entendimento é que estes devem se beneficiar de maneira mais rápida da queda de juros. A BRF (BRFS3) também tem viés positivo por ser beneficiada pela queda forte dos custos nos próximos 12 meses, a exemplo de grãos, frete marítimo e diesel. Já no setor de distribuição de combustível, Cosan (CSAN3) e Vibra (VBBR3) são citadas por se beneficiarem de uma maior estabilidade de preços praticada pela Petrobras – que também é investida pela gestora.

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