Como ações e Cemig (CMIG4) e da Copasa (CSMG3) fecharam em forte queda no pregão de quarta-feira (22) na B3após o governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), sinalizar uma possível federalização de ambas as estatais mineiras. Porém, foi outra movimentação no mercado acionário naquele dia que chamou a atenção dos investidores.

Circulou nas mesas de operações nesta quinta-feira (23), e em comunidades no Whatsappuma informação capturada pela Plataforma Quantizada. A casa de análise e empresa de tecnologia e educação para investidores identificou na segunda-feira (20) a montagem de uma “posição enorme” no mercado de opções com ordens de venda (colocar) em Cemig.

Crédito: Reprodução site da empresa

Pelos dados obtidos pela plataforma, e confirmados pelo Investnews com operadores de renda variável e derivativos, aparecem “boletas grandes” em duas corretoras nacionais, que passaram 7 milhões em compra de opções de colocar em CMIG4 no dia 20, nos valores de R$ 0,36 e R$ 0,37. Já no dia 22, houve a saída dessas ordens, totalizando 7,5 milhões em opções, apenas por uma corretora, a R$ 1,37.

“Dividiu-se a operação na entrada, mas a saída fez tudo em uma só. Quem comprou a put, dá R$ 1 de ganho com a queda do papel”, explica um profissional que falou sob a confiança de não ser identificado. “São R$ 7,5 milhões em dois dias no bolso”, emenda o operador, citando dados obtidos pelo histórico da B3 e o sistema BLK.

Movimentação incomum

Segundo a mensagem que circulou no aplicativo de mensagens instantâneas, no dia 20, o investidor apostou cerca de R$ 5 milhões, em termos financeiros, na queda do papel. Com a divulgação da notícia, o mesmo cliente teria embolsado cerca de R$ 15 milhões na quarta (22/11), desmontando a posição em três dias.

“Certamente é coincidência, muita sorte”, diz o post que circulou pelo Whatsapp com o seguinte título: “Tutorial para ganhar R$ 15 milhões em apenas 3 dias!”. Profissionais consultados não escondem o espanto com a operação, apontada por eles como sinais de informação privilegiada (interno), mas que deixou rastros na entrada e na saída, em tempo real.

“Cadê a CVM (Comissão de Valores Mobiliários)?”, questiona outro operador de uma corretora nacional, indagando sobre a demora na atuação da autarquia responsável pela regulação do mercado de valores mobiliários, que deveria investigar a movimentação incomum – e suspeita.

Procurada, a CVM informou que acompanha e analisa informações e movimentações no âmbito do mercado, tomando as medidas cabíveis, sempre que necessário.  ”A Autarquia não comenta casos específicos”, disse, por nota.

“Não é possível cravar que é internosomente podemos dizer que é algo no mínimo suspeito. Quem tem que investigar são as autoridades competentes”.

Pedro Menin, cofundador da Quantzed.

Para ele, parece “muito improvável” que a compra de opção de venda seja uma operação apenas de proteção, ainda mais levando-se em conta o tamanho tão relevante e em um papel com pouca liquidez em opções.

Operação ‘Pão de Queijo’

Vale lembrar que naquele dia 20, feriado em várias cidades brasileiras – exceto em Belo Horizonte, entre outras – houve pregão normal na B3, embora com liquidez menor. Dois dias depois, foi publicada uma entrevista de Zema no Valor Econômico, na qual o governador mineiro dizia que pretende usar a federalização para abater a dívida do estado com a União.

Posteriormente, a informação foi confirmada pela assessoria do governo de Minas Gerais e também do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), com quem Zema se reuniu para verificar as condições da possível federalização. A questão é que, se tiver andamento, a operação elimina qualquer chance de privatizar alguma empresa mineira.

“Um ponto negativo é que cai bastante a probabilidade de alguma das duas empresas serem privatizadas. O fato do Zema estar concordando com essa possibilidade (de federalização), que era algo impensável até então, é ruim para a tese de privatização”.

Leonardo Piovesan, analista fundamentalista da Quantzed, em comentário.

Em reação à notícia de federalizar as companhias mineiras, as ações da Cemig e da Copasa fecharam o pregão de quarta-feira (22) em forte queda na B3. Enquanto CMIG4 perdeu 9,71%, liderando as quedas do Ibovespa e no menor valor desde 6 de abril, CSMG3 escorregou 2,83%. Durante a sessão, os papéis chegaram a entrar em leilão.

Os papéis da elétrica mineira naquele dia tiveram um giro financeiro seis vezes maior que o negociado no pregão anterior, enquanto o da companhia mineira de saneamento de água e esgoto teve um volume quase três vezes superior. Na quinta-feira (23), a queda continuou, ainda que mais comedida, com Cemig fechando com -3,17% e Copasa com -0,77%.

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Segundo o Itaú BBA, a federalização provavelmente levaria a alterações na gestão e nos planos estratégicos de ambas as empresas, que vinham com uma agenda operacional. “Cemig e Copasa possuem uma equipe de gestão muito boa, que tem conseguido implementar mudanças para melhorar a eficiência das empresas, apesar das restrições de serem empresas estatais”, destaca, em documento.

Esperança de privatização

Como divulgado pelo Investnews em agosto, desde a privatização e Copel (CPLE6), após uma bem-sucedida oferta de ações, o mercado financeiro alimentou expectativas quanto às possíveis próximas empresas a serem desestatizadas. Na linha de frente, Sabesp (SBSP3) despontava, mas Cemig e Copasa corriam por fora na disputa.

Na ocasião, o analista da Ativa Investimentos, Ilan Arbetman, apontava que o processo de privatização em Minas Gerais envolvia trâmites administrativos, uma vez que existe uma lei específica do estado que prevê a aprovação da desestatização por maioria da Assembleia Legislativa, além de um plebiscito público.

Para o analista, esses processos colocam Cemig e Copasa “no mesmo pote”, já sinalizando certa dificuldade da privatização de ambas. “Existe uma intenção do governo de Minas em avançar com esse plano, mas elas estão um pouquinho mais para trás”, avaliou Arbetman, da Ativa, à época. Agora, porém, essa boa vontade mineira parece que virou lenda.

Sem pânico

Cemig e Copasa informaram nesta sexta-feira (24) o recebimento de ofício do Estado de Minas Gerais, acionista controlador de ambas companhias, informando que têm buscado soluções junto à União para a questão da dívida pública estadual. O governo mineiro tem o terceiro maior endividamento entre os estados, atrás apenas do Rio Grande do Sul, em primeiro lugar, e do Rio de Janeiro.

“Nesse sentido, foram apresentadas ao governo de Minas Gerais alternativas, que ainda serão objeto de análise minuciosa, tanto pelos técnicos do governo federal, quanto do governo estadual, razão pela qual ainda não houve qualquer manifestação ou aceite do governo do estado sobre o ponto referente a eventual federalização das estatais estaduais com ações listadas na Bolsa de Valores”, diz o comunicado das companhias.

Ainda assim, o caminho da federalização também é desafiador e longo, repleto de incertezas, o que tende a aumentar a volatilidade das ações de ambas as empresas com capital aberto. A proposta pode incluir outra estatal mineira, a Codemig. Por isso, alertou o Itaú BBA em relatório divulgado na terça-feira (21), não se deve “entrar em pânico com a notícia”.

Para o BTG Pactual, o endosso de Zema ao processo de federalização sinaliza que a intenção é fazer com a Cemig o que o governo federal não conseguiu ter com a Eletrobras (ELET3). Isso porque, considerando-se o valor de mercado de R$ 30 bilhões da elétrica mineira, por exemplo, e a participação do estado de Minas Gerais de 17%, o valor de R$ 5 bilhões correspondente que passaria a ser federalizado seria “irrisório” perto da dívida na casa de R$ 160 bilhões que o estado mineiro tem com a União, explica em relatório.

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